segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Lula e Dilma assinam decreto que alagará diversas cavernas do Brasil

E foi assinado o decreto...

O Vale do Ribeira tem que se mexer!


DECRETO No- 6.640, DE 7 DE NOVEMBRO DE 2008
Dá nova redação aos arts. 1o, 2o, 3o, 4o e 5oe acrescenta os arts. 5-A e 5-B ao Decretono 99.556, de 1o de outubro de 1990, quedispõe sobre a proteção das cavidades naturaissubterrâneas existentes no territórionacional.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuiçãoque lhe confere o art. 84, inciso IV, e tendo em vista o disposto nosarts. 20, inciso X, e 216, inciso V, da Constituição, e na Lei no 6.938,de 31 de agosto de 1981,D E C R E T A :Art. 1o Os arts. 1o, 2o, 3o, 4o e 5o do Decreto no 99.556, de 1ode outubro de 1990, passam a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 1o As cavidades naturais subterrâneas existentes noterritório nacional deverão ser protegidas, de modo a permitirestudos e pesquisas de ordem técnico-científica, bem como atividadesde cunho espeleológico, étnico-cultural, turístico, recreativoe educativo.Parágrafo único. Entende-se por cavidade natural subterrâneatodo e qualquer espaço subterrâneo acessível pelo ser humano,com ou sem abertura identificada, popularmente conhecido comocaverna, gruta, lapa, toca, abismo, furna ou buraco, incluindo seuambiente, conteúdo mineral e hídrico, a fauna e a flora ali encontradose o corpo rochoso onde os mesmos se inserem, desdeque tenham sido formados por processos naturais, independentementede suas dimensões ou tipo de rocha encaixante." (NR)"

Art. 2o A cavidade natural subterrânea será classificada deacordo com seu grau de relevância em máximo, alto, médio oubaixo, determinado pela análise de atributos ecológicos, biológicos,geológicos, hidrológicos, paleontológicos, cênicos, histórico-culturais e socioeconômicos, avaliados sob enfoque regionale local.
§ 1o A análise dos atributos geológicos, para a determinaçãodo grau de relevância, deverá ser realizada comparando cavidadesda mesma litologia.
§ 2o Para efeito deste Decreto, entende-se por enfoque locala unidade espacial que engloba a cavidade e sua área de influênciae, por enfoque regional, a unidade espacial que englobano mínimo um grupo ou formação geológica e suas relações como ambiente no qual se insere.
§ 3o Os atributos das cavidades naturais subterrâneas listadosno caput serão classificados, em termos de sua importância, emacentuados, significativos ou baixos.
§ 4o Entende-se por cavidade natural subterrânea com graude relevância máximo aquela que possui pelo menos um dosatributos listados abaixo:I - gênese única ou rara;II - morfologia única;III - dimensões notáveis em extensão, área ou volume;IV - espeleotemas únicos;V - isolamento geográfico;VI - abrigo essencial para a preservação de populações geneticamenteviáveis de espécies animais em risco de extinção,constantes de listas oficiais;VII - hábitat essencial para preservação de populações geneticamenteviáveis de espécies de troglóbios endêmicos ou relíctos;VIII - hábitat de troglóbio raro;IX - interações ecológicas únicas;X - cavidade testemunho; ouXI - destacada relevância histórico-cultural ou religiosa.
§ 5o Para efeitos do § 4o, o atributo a que se refere seu incisoV só será considerado no caso de cavidades com grau de relevânciaalto e médio.
§ 6o Entende-se por cavidade natural subterrânea com graude relevância alto aquela cuja importância de seus atributos sejaconsiderada, nos termos do ato normativo de que trata o art. 5o:I - acentuada sob enfoque local e regional; ouII - acentuada sob enfoque local e significativa sob enfoqueregional.
§ 7o Entende-se por cavidade natural subterrânea com grau derelevância médio aquela cuja importância de seus atributos sejaconsiderada, nos termos do ato normativo de que trata o art. 5o:I - acentuada sob enfoque local e baixa sob enfoque regional;ouII - significativa sob enfoque local e regional.
§ 8o Entende-se por cavidade natural subterrânea com graude relevância baixo aquela cuja importância de seus atributos sejaconsiderada, nos termos do ato normativo de que trata o art. 5o:I - significativa sob enfoque local e baixa sob enfoque regional;ouII - baixa sob enfoque local e regional.
§ 9o Diante de fatos novos, comprovados por estudos técnico-científicos, o Instituto Chico Mendes de Conservação daBiodiversidade - Instituto Chico Mendes poderá rever a classificaçãodo grau de relevância de cavidade natural subterrânea,tanto para nível superior quanto inferior." (NR)"

Art. 3o A cavidade natural subterrânea com grau de relevânciamáximo e sua área de influência não podem ser objeto deimpactos negativos irreversíveis, sendo que sua utilização devefazer-se somente dentro de condições que assegurem sua integridadefísica e a manutenção do seu equilíbrio ecológico." (NR)"

Art. 4o A cavidade natural subterrânea classificada com graude relevância alto, médio ou baixo poderá ser objeto de impactosnegativos irreversíveis, mediante licenciamento ambiental.
§ 1o No caso de empreendimento que ocasione impacto negativoirreversível em cavidade natural subterrânea com grau derelevância alto, o empreendedor deverá adotar, como condiçãopara o licenciamento ambiental, medidas e ações para assegurar apreservação, em caráter permanente, de duas cavidades naturaissubterrâneas, com o mesmo grau de relevância, de mesma litologiae com atributos similares à que sofreu o impacto, queserão consideradas cavidades testemunho.
§ 2o A preservação das cavidades naturais subterrâneas, deque trata o § 1o, deverá, sempre que possível, ser efetivada emárea contínua e no mesmo grupo geológico da cavidade quesofreu o impacto.
§ 3o Não havendo, na área do empreendimento, outras cavidadesrepresentativas que possam ser preservadas sob a formade cavidades testemunho, o Instituto Chico Mendes poderá definir,de comum acordo com o empreendedor, outras formas decompensação.
§ 4o No caso de empreendimento que ocasione impacto negativoirreversível em cavidade natural subterrânea com grau derelevância médio, o empreendedor deverá adotar medidas e financiarações, nos termos definidos pelo órgão ambiental competente,que contribuam para a conservação e o uso adequado dopatrimônio espeleológico brasileiro, especialmente das cavidadesnaturais subterrâneas com grau de relevância máximo e alto.
§ 5o No caso de empreendimento que ocasione impacto negativoirreversível em cavidade natural subterrânea com grau derelevância baixo, o empreendedor não estará obrigado a adotarmedidas e ações para assegurar a preservação de outras cavidadesnaturais subterrâneas." (NR)"

Art. 5o A metodologia para a classificação do grau de relevânciadas cavidades naturais subterrâneas, considerando o dispostono art. 2o, será estabelecida em ato normativo do Ministro de Estado do Meio Ambiente, ouvidos o Instituto Chico Mendes,o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos NaturaisRenováveis - IBAMA e demais setores governamentais afetos ao tema, no prazo de sessenta dias, contados da data de publicaçãodeste Decreto." (NR)

Art. 2o Fica acrescido os arts. 5-A e 5-B ao Decreto no99.556, de 1990, com a seguinte redação:"

Art. 5o-A. A localização, construção, instalação, ampliação,modificação e operação de empreendimentos e atividades, consideradosefetiva ou potencialmente poluidores ou degradadoresde cavidades naturais subterrâneas, bem como de sua área deinfluência, dependerão de prévio licenciamento pelo órgão ambientalcompetente.
§ 1o O órgão ambiental competente, no âmbito do processode licenciamento ambiental, deverá classificar o grau de relevânciada cavidade natural subterrânea, observando os critériosestabelecidos pelo Ministério do Meio Ambiente.
§ 2o Os estudos para definição do grau de relevância dascavidades naturais subterrâneas impactadas deverão ocorrer a expensasdo responsável pelo empreendimento ou atividade.
§ 3o Os empreendimentos ou atividades já instalados ouiniciados terão prazo de noventa dias, após a publicação do atonormativo de que trata o art. 5o, para protocolar junto ao órgãoambiental competente solicitação de adequação aos termos desteDecreto.
§ 4o Em havendo impactos negativos irreversíveis em cavidadesnaturais subterrâneas pelo empreendimento, a compensaçãoambiental de que trata o art. 36 da Lei no 9.985, de 18 dejulho de 2000, deverá ser prioritariamente destinada à criação eimplementação de unidade de conservação em área de interesseespeleológico, sempre que possível na região do empreendimento."(NR)"

Art. 5-B. Cabe à União, por intermédio do IBAMA e doInstituto Chico Mendes, aos Estados, ao Distrito Federal e aosMunicípios, no exercício da competência comum a que se refereo art. 23 da Constituição, preservar, conservar, fiscalizar e controlaro uso do patrimônio espeleológico brasileiro, bem comofomentar levantamentos, estudos e pesquisas que possibilitemampliar o conhecimento sobre as cavidades naturais subterrâneasexistentes no território nacional.Parágrafo único. Os órgãos ambientais podem efetivar, naforma da lei, acordos, convênios, ajustes e contratos com entidadespúblicas ou privadas, nacionais, internacionais ou estrangeiras,para auxiliá-los nas ações de preservação e conservação,bem como de fomento aos levantamentos, estudos e pesquisasque possibilitem ampliar o conhecimento sobre as cavidades naturaissubterrâneas existentes no território nacional." (NR)

Lula e Dilma querem alterar decreto que protege cavernas do Brasil

Prezados,


Está na Casa Civil uma minuta de decreto que, se assinada, vai permitir a destruição de mais de 70% das cavernas brasileiras.

A Sociedade Brasileira de Espeleologia (SBE), procupada em defender opatrimônio espeleológico, divulgou um MANIFESTO CONTRA O RETROCESSO NALEGISLAÇÃO ESPELEOLÓGICA BRASILEIRA e já conta conta com o apoio de 90outras instituições.

Assim, solicitamos que todos interessados na preservação de nossas cavernasacessem a página abaixo e apoiem as iniciativas para barrar a proposta dedestruição das cavernas brasileiras:

http://www.sbe.com.br/manifesto.asp

Agradecemos a todos que, espontaneamente, já manifestaram seu apoio eestamos à disposição para qualquer esclarecimento.

Sociedade Brasileira de Espeleologia
Desde 1969 lutando pela preservação das cavernas brasileiras

www.sbe.com.br - (+55 19) 3296-5421 - Caixa Postal 7031, 13076-970,Campinas-SP, Brasil

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Impactos de Tijuco Alto sobre o Lagamar

(publicado no informativo do MOAB, Agosto/2008)

Ainda existem pessoas que se perguntam: por que este povo de Cananéia está brigando tanto para que a Barragem de Tijuco Alto não seja liberada pelo IBAMA? Uma Usina que está 330 km para cima da foz do rio Ribeira pode mesmo afetar a vida das populações que moram lá embaixo? A história tem mostrado que sim. No mundo inteiro e também no Brasil, barragens têm afetado o equilíbrio ecológico e a economia de milhões de pessoas na faixa litorânea. No Brasil, o caso mais emblemático é do Rio São Francisco, que agoniza de forma impressionante.

Este rio já não tem forças para avançar no mar, suas margens estão completamente ocupadas por monoculturas e a pesca está numa situação de penúria. Um dos motivos para esta redução de volume e da pesca é a série de barragens construídas no seu leito, entre elas, a de Sobradinho. No último ano, eventos de seca que diminuíram a vazão e o nível do rio, forçaram os funcionários da Usina a reduzir a passagem de água pela barragem, segurando a água do São Francisco, a fim de garantir o funcionamento das turbinas da Usina Hidrelétrica (UHE). A extrema redução de vazão rio abaixo, resultou num grande impacto a jusante, reduzindo rapidamente o nível das águas (e o seu volume) e causando uma grande mortandade de peixes.

O Rio Ribeira corre, no mínimo, o mesmo risco. O Complexo Estuarino Lagunar de Iguape-Cananéia-Paranaguá – apelidado de Lagamar - representa um eixo natural e cultural de alta relevância nacional onde desemboca o rio Ribeira de Iguape. Apesar de estar relativamente distante do local escolhido para ser construída a Usina Hidrelétrica de Tijuco Alto percebemos, quando entendemos a dinâmica do rio, que alguns dos impactos que esta região sofreria estão ligados à vazão do rio. Assim, ecossistemas de manguezal, restinga, costão rochoso e praias arenosas poderiam ter seu equilíbrio abalado.

O rio Ribeira, como muitos outros rios, passa por um período de chuva e um período de seca bem nítidos. Com isso a quantidade de água do rio muda, ou seja, a vazão do rio muda. Na época de chuva há uma vazão maior do que na época seca. Um dos fatores que diminui essa diferença de vazão – trazendo equilíbrio para o sistema - é que a água da chuva infiltra no solo e, durante a seca, parte desta água subterrânea abastece o rio.

Mas ao contrário de muitos lugares, a Bacia Hidrográfica do Ribeira de Iguape pode ser dividida em duas partes, uma do Alto e Médio Ribeira (da nascente do rio até 5 km antes de Registro) e outra do baixo Ribeira (de Registro até o estuário). Na parte Alta, onde está prevista a construção da UHE Tijuco Alto, o relevo é montanhoso e naturalmente sofre erosão. Nessa região a terra nas margens do rio tem muita argila e quando ela fica sem nenhuma proteção das raízes da mata, impede a passagem de água pelo solo, diminuindo a quantidade de água subterrânea.

Isso já acontece, por exemplo, nas estradas de terra criadas nas plantações de Pinus e eucalipto, nas cabeceiras do Ribeira. Não é a toa que muitos ribeirinhos afirmam que o rio já tem menos água. Se Tijuco Alto for construída, além das estradas que serão abertas e piorarão este problema, a UHE liberará menos água para garantir a mesma quantidade de energia, na época seca. Com isso, a vazão do rio vai diminuir mais ainda. Mas por que menos vazão de água é tão prejudicial ao Lagamar?

A região do Lagamar, no baixo Ribeira, é uma planície de água calmas que compõe um grande estuário, entre São Paulo e Paraná. O estuário existe porque há mistura de água doce dos rios, principalmente do Ribeira, com água salgada do mar. Os animais que moram aí estão acostumados a viverem nesse lugar característico e dependem da vazão do rio. Sua alimentação e sua movimentação, bem como a sua reprodução, dependem da velocidade e da salinidade de suas águas. Muitos peixes são assim. É o caso da manjuba pescada em Iguape. Esse peixe depende da vazão do rio e 80% dos moradores de Iguape dependem da pesca da manjuba. Menos vazão, menos manjuba e 80% das pessoas que moram em Iguape perdem seu tradicional modo vida!

A Companhia Brasileira de Alumínio, do Grupo Votorantim, divulga que a Barragem de Tijuco Alto controlaria as cheias do Ribeira e que traria desenvolvimento para a região, principalmente através de empregos. Este foi o discurso da CBA/CNEC nas audiências públicas ocorridas em Cerro Azul, Adrianópolis (PR), Ribeira, Eldorado e Registro (SP). Obviamente um discurso que não convenceu a população do Vale do Ribeira, já que o controle de cheias não foi satisfatoriamente explicado, pois como evitar algo que é natural à dinâmica do rio? Além disso, o excesso de cheias se deve ao desmatamento das margens do Ribeira, principalmente para o plantio de monoculturas de banana, Pinus e gado. Não precisa construir barragem para controlar cheia. É só cuidar e manter a mata ciliar!

A “gigantesca” oferta de 60 empregos fixos também chega a ser uma afronta à inteligência dos moradores do Vale do Ribeira. Se 2.500 pescadores de manjuba sustentam diretamente as suas famílias em Iguape (cerca de 10.000 pessoas), o que aconteceria se este peixe tivesse a sua população reduzida, afetando a produção pesqueira? Conclusão: a ameaça de desemprego é maior, bem maior, que a de emprego. Além dissoo, a manjuba também faz parte da teia alimentar das espécies aquáticas do Lagamar. O desequilíbrio destas cadeias poderia afetar inclusive espécies de grande importância turística para Cananéia, como o boto-cinza, símbolo da cidade. Muitas das pessoas que visitam o Lagamar vem buscar esta beleza, de importância não só paisagística, mas comportamental. E estes são apenas alguns poucos exemplos.

Infelizmente quando os pesquisadores da CNEC fizeram seus estudos não consideraram a Bacia toda, desrespeitando a Legislação Nacional e do estado de São Paulo, além dos Planos Nacional e Estadual de Recursos Hídricos. Optaram por ignorar esta população e os impactos que ela sofrerá. E tudo isso com aval do Ibama... Chega de ter uma visão pequena, mesquinha! A Bacia do Rio Ribeira tem que ser considerada como um todo, desde a sua nascente, até o seu estuário. Toda a população do Vale do Ribeira se conecta entre si através do Ribeira. É o rio da unidade regional e um pequeno pescador em Cananéia pode sim ter o seu modo de vida alterado por um empreendimento no eixo do rio, mesmo a quilômetros de distância. É que mostram o estudos e a história.

É por este entendimento de unidade, de preocupação com a ecologia e com a economia da região, seriamente ameaçadas, que a população do Lagamar – Iguape e Cananéia – reivindicam pelo menos mais uma audiência pública na região e que seja... no Lagamar.

Mayra Jankowsky e André Murtinho Ribeiro Chaves
(Coletivo Educador do Lagamar – Núcleo Cananéia)

Barragem afeta estuário, sim senhores...

01/11/08 - 22h55 - Atualizado em 01/11/08 - 22h55
Casas estão ameaçadas pelo mar na Paraíba

Cliquem em cima do endereço-e e assistam a reportagem:

http://jornalnacional.globo.com/Telejornais/JN/0,,MUL846109-10406,00-CASAS+ESTAO+AMEACADAS+PELO+MAR+NA+PARAIBA.html

As praias são formadas por areia trazida pelo rios e como a maioria é represada para o abastecimento das cidades, a areia não chega até a praia e o mar toma conta da encosta, arrastando casas.

Na Paraíba, o mar avança e ameaça destruir casas e prédios no litoral. O motivo, mais uma vez, é a interferência do homem no meio ambiente. A praia quase desapareceu. Num trecho na Baía da Traição, no litoral norte da Paraíba, casas foram levadas pela água e mais de 50 podem cair. “Nós construímos essas casas com nossos esforços, tirando da pescaria, da agricultura e, de repente o mar levar assim, fica difícil para nossos filhos”, lamenta um homem. Quem nasceu na região, não consegue entender. “Nunca tinha visto. Estou com 50 anos e acho que a maioria do pessoal da minha idade também não viu isso”, disse um homem. Em João Pessoa, o problema chegou às principais praias e ameaça a Ponta do Seixas, extremo oriental das Américas. Uma pesquisa da Universidade Federal da Paraíba mostra que não foi o mar que avançou. As praias são formadas por areia trazida pelo rios e como a maioria é represada para o abastecimento das cidades, a areia não chega até a praia e o mar toma conta da encosta. “A água chegou porque o material sedimentar não está mais fazendo a contenção, tanto é que hoje nós estamos muito acima de praia porque o sedimento já foi levado embora”, explicou o geógrafo Paulo Rosa. Uma barragem é a principal reserva de água para o abastecimento da Grande João Pessoa. Segundo a pesquisa do geógrafo, os efeitos para construção da represa, ocorrida há 18 anos, estão sendo percebidos agora, principalmente nas praias do litoral sul do estado. Pitimbu foi uma das mais atingidas. A maioria dos moradores da orla, já deixou as casas. “A cada maré alta que acontecem, o mar vai batendo, a água vai escorrendo e chega até perto da calçada”, conta a freira Iracema Lemos. Ruínas, casas fechadas com placas de venda. A menos de dois meses do verão, a imagem lembra uma cidade abandonada.

Uma história do povo e das águas

Mayra Jankowsky
André Murtinho Ribeiro Chaves

Setembro/2008

(publicado no livro "Reza a Lenda: a cultura caiçara de Cananéia vivenciada no bairro rural de Santa Maria", de Bianca Cruz Magdalena)

Reza a lenda, certa noite de lua cheia, um pescador no rio Ribeira, próximo à imensidão do mar, escutou um barulho estranho, mas que não era o peixe cantando... Sentado em sua canoa prestou atenção e para sua surpresa eram as águas falando. E era uma história muito antiga:
“Muitas águas se passaram nesse rio: são nossos ancestrais aos quais somos muito ligados, desde lá de cima, onde nascemos, até aqui onde nos misturamos com nossos salgados irmãos. Mas um rio de tamanha importância e que damos vida, temos por obrigação conhecer sua história. Porque sua historia não é sozinha, ela conta muitas histórias. Desde que o rio existe, nós, as águas, vimos muitos tipos de peixes, de plantas, de bichos e, recentemente, até de gente.”
O pescador prestou atenção, pois nessa hora, a história a ser contada era dos povos que viveram ao longo do rio:
“Já vimos gente de muitos tipos e durante muitos séculos essa gente toda foi mudando, mas viviam sempre junto do rio, pescando e plantando. Diferente de agora. Agora ainda tem gente que mora junto do rio, e como antes, caça, planta e pesca, mas tem quem faz diferente. O povo mais antigo, planta mandioca, banana, milho, mexerica, feijão, arroz, cana e outras coisas. Ainda pescam e caçam. Cresceram junto do rio e da mata. Até começaram a plantar diferente, juntando a floresta com a comida deles, que hoje eles chamam de agrofloresta. Já quem mora distante (e não sofrerá as conseqüências), vive de outras coisas, mas ainda vem usar o rio. De início, só usavam a água em umas plantações muito estranhas, plantações de uma coisa só que muitas vezes não são nem para eles comerem. É pinus, é eucalipto, é banana... Para plantar muito de uma coisa só, eles abrem estradas e chegam até a beira do rio. Com isso a água da chuva que devia ir para a terra e depois encontrar com as águas do rio acaba indo muito rápido para o rio. Só que nessa época, o rio já tem bastante água por causa da chuva. Mas em tempo que não chove são as águas da terra que deveriam passar para o rio, mas a terra já não tem mais água e o rio vai secando... Então, esse povo que se criou junto com rio vai se perdendo...
Ainda agora, nos últimos vinte anos, pensaram em fazer uma outra coisa diferente, parar as águas do rio para tirar força das águas que passam descendo. E nem é para o povo deste rio... esta energia vai para bem longe! É a barragem da Usina Hidrelétrica de Tijuco Alto. Vai ter água - muitos irmãos nossos - que ficará presa por muito tempo, no meio da podridão, e só uma parte vai poder continuar livre, sendo rio. E todo mundo vai sentir falta dessa água livre e pura: as plantas, os animais e o povo que vive do rio. As pessoas, que diferente dos outros animais e plantas, sabem falar, não são bobos nem nada, há alguns anos gritam que não querem essa tal hidrelétrica. Gritam, usando a ciência dos homens, que não vão mais ter roça, que não vão mais ter peixe, e pior: que toda sua história e seu saber vão se perder e, assim como as águas limpas, vão ficar parados, enfraquecer e talvez sumir.
É o que está acontecendo com os peixes e os povos que vivem lá no mangue, um povo caboclo chamado caiçara, que planta e que pesca, do morro até a praia. Este povo vive da pesca da manjuba, um peixe pequeno e saboroso, pescado há muitos e muitos anos e que sustenta milhares de caiçaras. Este sustento pode ter fim, já que nós, as águas do Ribeira, podemos chegar cada vez menos para este peixe e para o povo. E este povo que sempre cuidou para este sustento não acabar... E agora vem os homens ricos deste país e querem acabar com esta história de vida, estancar nossos irmãos e trazer a morte.O mais estranho é que outros homens, desse mesmo povo, que nem vivem aqui, vão decidir o futuro do rio. Dá medo, porque já escutamos as águas de outros rios, contando sua triste história, de muitas barragens e pouca água, de muita energia e pouca comida, de muita promessa e pouca oportunidade, até o povo do rio ir embora. Na cultura destes homens (que eu não entendo), riqueza é juntar todo o dinheiro do mundo na mão de poucas pessoas. Eles dizem que assim, vão melhorar tudo, mas vejo que o caiçara (que cuida melhor das águas) já sabe o que querem estes homens: eles querem mandar na água e na terra, tirar tudo o que puderem e vender para fora, pros estrangeiros. Para isto, já estão querendo fazer mais um porto lá em Piaçaguera, também em cima de nossa terra e do sofrido povo guarani... E isto também não é lenda, como a voz dessas águas. Isto é uma outra e triste história...”