sexta-feira, 27 de março de 2009

Deu no Brasil de Fato!

Marcha defende direito de muitos contra direito de um empresário
por Michelle Amaral da Silva última modificação 16/03/2009 17:17

http://www.brasildefato.com.br/v01/agencia/nacional/marcha-popular-do-direito-de-todos-contra-o-direito-de-um-empresario/?searchterm=tijuco%20alto

No Vale do Ribeira, 400 pessoas marcharam para reforçar os 20 anos de resistência à construção da usina hidrelétrica de Tijuco Alto

16/03/2009
Pedro Carrano
de Ribeira (SP)

Ribeirinhos, caiçaras, quilombolas e pescadores marchavam ao lado de estudantes, ambientalistas e camponeses ameaçados de perder a terra onde produzem. No Vale do Ribeira, fronteira entre São Paulo e Paraná, cerca de 400 pessoas marchavam para reforçar os 20 anos de resistência à construção da usina hidrelétrica de Tijuco Alto, projetada pela Companhia Brasileira de Alumínio (CBA), junto a outras três barragens, ao longo do corpo do rio Ribeira de Iguape.

O Movimento dos Ameaçados por Barragens (Moab) é a sigla que aglutina as lutas dessa região. O ato era mais um momento do Dia Internacional de Luta Contra as Barragens. O trecho entre as cidades de Ribeira (SP) e Adrianópolis (PR) foi atravessado pela marcha, em um trabalho de conscientização da população. Uma faixa do comércio local apoiava Tijuco Alto, mas os manifestantes gritaram alto: “Terra sim, barragens não”. O lema do movimento é o direito à terra pelos seus moradores, algo que está em contradição com o projeto que beneficia a CBA – pertencente ao empresário Antônio Ermírio de Moraes. A finalidade de Tijuco Alto é alimentar uma planta de produção de alumínio, em cidade há 250 quilômetros dali.

Ernani Coutinho, ribeirinho e quilombola, coleta peixes e moluscos no encontro do rio Iguape com o mar, em Cananéia (SP), no complexo estuarino mais conhecido como Lagamar. Tomou parte no movimento há vinte anos, quando teve início. Hoje, está ao lado de trabalhadores de outras vinte cidades. “Somos todos pobres, temos que nos organizar”, reivindica. Onde Coutinho vive, mais de 3 mil pessoas dependem da pesca da manjuba – uma espécie de peixe que pode ser afetada pela mudança na salinidade da água, resultado da barragem.

Riqueza natural e apropriação privada

O Vale do Ribeira mantém 21% da Mata Atlântica restante no país. Assim mesmo, os morros e a natureza que contornam a cidade do Ribeira enganam: atravessar as estradas do Vale é deparar com o projeto de plantação de pinus, cujos proprietários desertificam o solo e não respeitam acordos mínimos: a região de topo de morro, o entorno dos rios. Na paisagem, é comum a longa faixa de pinus, para logo vermos a faixa desértica. Na lógica do lucro e da exploração, a região do Vale amarga o pior índice de desenvolvimento humano do Estado de São Paulo.

O grupo Votorantim é conhecido por cooptação e despejo de trabalhadores rurais nas áreas onde realiza seus projetos. Uma favela inteira de Curitiba (PR), a Vila Esperança, recebeu agricultores expulsos das terras pela corporação brasileira. O atual projeto de Tijuco Alto alagará uma região equivalente a 11 mil campos de futebol, de acordo com informações do deputado estadual Raul Marcelo (Psol-SP). Dados apontam que municípios onde barragens foram instaladas seguem entre os piores se o assunto for o tal desenvolvimento humano.

A luta dos atingidos por barragens se confronta com o projeto decenal do governo Lula para o setor. Presente apoio ao ato, Hélio Mecca, da direção nacional do Movimento dos Atingidos pro Barragens (MAB), critica a construção de 1443 barragens projetada pelo atual governo. Mais barragens não são necessárias, uma vez que o estoque de águas atual é suficiente para vinte anos. Ademais, a produção de energia hoje, no Brasil, atende ao projeto de exportação das eletrointensivas, produtoras de alumínio e bauxita, com baixo emprego de força de trabalho, explica Mecca.

Dois projetos em colisão

No Vale do Ribeira, o ato teve caráter de procissão, misturando cantos afro-católicos, músicas da militância, e a batucada do maracatu. O Moab recebe o apoio do bispo da cidade de Registro (SP), para quem a luta do não se volta contra a tecnologia e os projetos por si mesmos, mas contra a falta de controle popular sobre eles. “O governo nunca consulta a sociedade, tudo vem de cima para baixo. Quando o povo participa temos boas propostas. O lema desta luta (“Terra sim, barragens não!”) é por que a terra produz alimento, mas as barragens não”, declama o bispo José Luiz Bertanha.

Hélio Mecca, do MAB, ressaltou o caráter de disputa de projetos, presente na atual jornada nacional de lutas. “Não basta confrontar com o existente, é preciso que a gente mostre alternativas, assim como o MST apresenta o projeto de reforma agrária para o campo, temos a obrigação de apresentar um projeto energético, popular e alternativo”, defende.

Risco eminente

O deputado Raul Marcelo (Psol-SP), que atua na luta contra Tijuco Alto, informou que o processo de licenciamento da barragem (a primeira do total de quatro) está em curso no Ibama. Falta apenas o relatório final. Há pouco, a Procuradoria Geral da República entrou com ação direta de inconstitucionalidade no caso, uma vez que o governo federal havia aprovado a liberação de exploração nas cavernas naturais do local.

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